Desde a primeira vez que assisti a CURTINDO A VIDA ADOIDADO, sempre achei meio fora do lugar o passeio que os protagonistas fazem ao museu. Afinal de contas, aquele é para ser o dia mais alegre e agitado que se pode ter: faltar a escola, dirigir uma Ferrarri, estar com os melhores amigos, almoçar num restaurante caríssimo e até mesmo cantar Beatles num carro alegórico no meio da rua.
Quando se chega ao
Instituto de Arte de Chicago, parece que o filme reduz seu ritmo vertiginoso, até porque o que geralmente é associado à própria ideia de museu é uma atitude contemplativa, pra não dizer “chato”, como muita gente acha. Hoje acredito que a cena do museu é o contraponto perfeito pra cena do
“Twist & Shout” (e não acho coincidência que elas sejam em sequência). Se Ferris cantando na parada alemã é o momento catártico do filme, a cena do museu tem como foco o momento em que os personagens entram em contato maior com suas complexas personalidades. É no museu, por exemplo, em que há a cena romântica entre Ferris e Sloane (até então, o relacionamento entre os dois me parecia ser algo mais de brincadeira do que um interesse amoroso genuíno).
Mas é especialmente Cameron que, numa cena breve e impactante, entra em contato com seu lado mais íntimo. Em meio a
Picassos, Kandinskys e
Hoppers, ele para em frente a “Tarde de Domingo na Ilha de La Grande Jatte”, de
Georges Seurat. Seu olhar (que também é o olhar do público) se concentra no rosto de uma menininha no quadro, acompanhada de sua mãe. E quanto mais próximo o olhar (o da câmera, o de Cameron, o nosso), mais desfocado se torna o rosto da menina. Da mesma forma,
closes
vez mais próximos de Cameron deixa apenas seus olhos azuis na tela.
É uma cena incrivelmente lenta e sensível num filme tão obcecado com a diversão a qualquer custo.
John Hughes parece querer fazer dela o centro emocional do roteiro, e a própria escolha de colocar “Please, Please, Please, Let Me Get What I Want” dos
Smiths como trilha-sonora reforça isso. Das análises que já li/ouvi sobre a cena, talvez a melhor mesma seja
a do próprio Hughes: a criança do quadro
é Cameron, e quanto mais perto se olha pra ela, menos se vê – e esse é o grande medo do personagem. Talvez para entender a vida por inteiro, é necessário dar alguns passos pra trás.
Essas cenas contam muitos pontos pro filme, principalmente a versão instrumental da música Please, Please, Please,... dos Smiths. Maravilhoso!!
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